sexta-feira, 24 de junho de 2016

A FARRA DOS PASSAPORTES DIPLOMÁTICOS NO BRASIL


CONCESSÃO DESMEDIDA

A farra dos passaportes diplomáticos no Brasil
Concessão desmedida abre brecha par a 'diplomacia do fura fila' (Foto: Rede Fonte)

"Na semana passada, a Casa da Moeda divulgou uma nota alertando que, por falta de matéria-prima para confeccionar passaportes, a emissão do documento está sendo atrasada em até 45 dias. Segundo a Polícia Federal, solicitantes que não podem adiar a viagem devem pagar uma taxa de R$ 77,17 para acelerar o processo.
A situação seria diferente caso se tratasse de um passaporte diplomático. Emitidos pelo Itamaraty, sem custo para o solicitante, ele garante ao portador benefícios como atendimento especial, filas separadas, prioridade no tratamento da bagagem e dispensa de visto em alguns países.
Vários países emitem o documento para representantes do governo em missões no exterior. Porém, no Brasil, a falta de critério do Itamaraty para a concessão do documento por vezes já foi alvo de polêmica. Pelo decreto nº 5.978, que rege a lei de concessão de passaportes diplomáticos, têm direito ao documento presidentes, vices, ex-presidentes, ministros de Estado, membros do Congresso Nacional, chefes de missões diplomáticas e ministros dos tribunais superiores em missão no exterior. A validade do documento é determinada pelo Itamaraty, e o prazo varia dependendo do caráter da missão.
Porém, o Itamaraty pode conceder passaportes diplomáticos em caráter extraordinário, com base no parágrafo 3º, do Artigo 6º, do decreto, que autoriza a concessão se o motivo da viagem for “de interesse do país”. É aí que mora o problema.
Segundo um levantamento feito pelo Opinião e Notícia, desde 2011, o Itamaraty já concedeu 814 passaportes diplomáticos recorrendo ao artigo. O levantamento foi feito com base em dados publicados no Diário Oficial da União. Desde 2011, uma portaria exige que o solicitante informe ao Itamaraty a razão do pedido fundamentada por órgão competente. É dever do Itamaraty analisar o pedido e publicar as concessões no Diário Oficial.
A portaria, no entanto, não obriga o Itamaraty a publicar a missão referente à concessão do passaporte, deixando isso a critério do órgão. Raras foram as vezes em que o órgão publicou a missão. Isso abre brecha para uma concessão desmedida que gera a “diplomacia do fura fila” nos aeroportos, com tratamento especial a membros do Congresso e líderes religiosos em viagens privadas e acompanhados de cônjuges e dependentes, o que, pelo artigo 4 da portaria, só seria permitido caso a presença dos mesmos estivesse “vinculada à missão oficial do titular”.
Em 15 de janeiro deste ano, por exemplo, o Itamaraty concedeu passaportes diplomáticos ao ex-ministro do Tribunal de Contas da União Valmir Campello e à sua mulher, Marizalva Ximenes Maia Bezerra. Em 9 de maio, foi a vez do ex-ministro do Superior Tribunal de Justiça Cesar Asfor Rocha e sua mulher, Margarida Magda Bezerra de Figueiredo. Em nenhum dos dois casos a missão referente à solicitação foi divulgada.
Além disso, os pedidos foram fundamentados pelo TCU e pelo STJ, respectivamente, ignorando o fato de Campello e Cesar Asfor já não estarem mais em atividade. O decreto nº 5.978 autoriza o documento apenas aos “ministros do Supremo Tribunal Federal, dos Tribunais Superiores e do Tribunal de Contas da União”, não estendendo o direito a membros aposentados destes órgãos.
Outra polêmica se refere ao uso do passaporte diplomático por deputados, que têm direito ao documento, mas só podem usá-los em caso de missão no exterior. Segundou apurou o O&N, desde 2011, já foram concedidos 1.170 passaportes diplomáticos a deputados. O número é mais que o dobro do total de 513 deputados existentes na Câmara. Isso ocorre porque grande parte dos deputados também incluem filhos e cônjuges em sua solicitação. Eduardo Cunha (PMDB), por exemplo, obteve passaportes diplomáticos para sua mulher, Claudia Cruz, e seus três filhos. A missão diplomática que levou à concessão, no entanto, não foi revelada.
Outro deputado peemedebista que obteve passaportes diplomáticos para toda a família foi João Arruda, que conseguiu o documento para a mulher, Paola Malucelli de Arruda, e os três filhos menores de idade. Figura atualmente em destaque, a deputada Tia Eron (PRB) também fez uso do benefício, incluindo seus dois filhos, Eva e Éden, como dependentes. O deputado Romário, que recentemente confirmou sua pré-candidatura à prefeitura do Rio de Janeiro, também retirou passaporte diplomático, incluindo quatro filhos menores de idade como dependentes. Jair Bolsonaro também é portador do documento, e incluiu como dependente seu filho, Jair Renan Valle Bolsonaro.

A questão dos líderes religiosos
Em 2013, o Itamaraty foi duramente criticado por conceder passaportes diplomáticos ao pastor Valdemiro Santiago de Oliveira e sua mulher, Franciléia de Castro Gomes de Oliveira, líderes da Igreja Mundial do Poder de Deus. O casal teve os passaportes concedidos em três ocasiões: no dia 14/12/2011; no dia14/01/2013; e outro no dia 07/02/2014. O motivo da concessão extraordinária não foi divulgado.
A polêmica levou o MPF a instaurar um inquérito civil para apurar a concessão de passaportes diplomáticos a líderes religiosos no país. O inquéritoInquerito Civil 1 foi instaurado pela Procuradoria da República no Município de Santa Maria. Porém, ele foi arquivado antes mesmo de ser aberto.
O documento de arquivamento do inquérito, obtido pelo O&N, informa que o arquivamento se deu porque a concessão do documento aos religiosos em questão está dentro da lei, pois serve aos interesses do país. A explicação dada pelo Itamaraty é que “o apoio social prestado pelas organizações religiosas mundo afora projeta a imagem do Brasil” (confira ao lado o documento na íntegra). No entanto, o órgão não especifica se a concessão está de acordo com a laicidade do Estado prevista na Constituição.
Além de Valdomiro, outros líderes religiosos receberam o benefício. O bispo Edir Macedo, da Igreja Universal do Reino de Deus (IURD), e sua mulher, Ester Eunice Rangel Bezerra, ganharam passaportes diplomáticos nos dias 11/11/2011 e 08/01/2014. O cardeal, Aury Affonso Hummes, conhecido como Dom Frei Cláudio Hummes, recebeu o documento em 20/04/2012. O cardeal Geraldo Majella Agnelo recebeu em 18/11/2011.
Porém, os campeões em retirada de passaportes diplomáticos são os pastores Romildo Ribeiro Soares, conhecido como RR Soares, e sua mulher, Maria Magdalena B. R. Soares. Ambos tiveram o benefício concedido em cinco ocasiões: em 18/11/2011 (amparado pelo Senado Federal, embora Romildo não exercesse cargo na Casa); em 14/12/2011; em 16/01/2013; em 24/12/2013; e em 07/02/2014, quando o Itamaraty concedeu ao casal documentos com validade de três anos.
A troca de comando no Itamaraty não mudou a prática. No mês passado, sob o comando do ministro José Serra (PSDB), o órgão mais uma vez causou polêmica ao conceder passaporte diplomático ao pastor Samuel Cássio Ferreira, da Assembleia de Deus, e sua mulher, Keila Campos Costa, em 18/05/2016. O casal já havia retirado passaportes diplomáticos em outras duas ocasiões: uma em 16/01/2013; outra em 13/11/2013.
Romildo Soares e Samuel Cássio são próximos de Eduardo Cunha. O primeiro chegou a agradecer Cunha em uma ocasião por livrá-lo de pagar uma “dívida demoníaca” (uma multa de R$ 60 milhões aplicada em 2014, pela Receita Federal, por sonegação de impostos). O segundo é suspeito na Lava Jato de lavar dinheiro para Cunha. Cássio também tem laços estreitos com o presidente interino Michel Temer (PMDB), que já o convidou para celebrar um culto ecumênico no Palácio do Planalto em 12 de maio, quando assumiu o cargo de presidente interino.
Serra se comprometeu a rever a política de concessão dos passaportes diplomáticos, mas até agora não revelou as medidas que pretende tomar. Procurado pelo O&N, o Itamaraty não respondeu até o final desta matéria por que as missões raramente são publicadas, nem qual o critério usado para decidir isso. O órgão também não informou se já há alguma previsão de mudança na política de concessão do documento, como prometeu Serra. Em tempos em que se discute a moralização da vida pública, a concessão de benefícios a parlamentares e a distinção entre o público e o privado, cabe ao órgão reavaliar a concessão do documento, especialmente aquelas feitas em caráter extraordinário."
Penso que  em que governo  for  essa prática é condenável pois deve-se ter  controle  dessa  emissão de documentos, regras mais  rígidas  e  severamente cumpridas  devem  ser a praxe.
Pensem nisso  enquanto  eu vos digo  até amanhã.

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