sábado, 13 de março de 2021

POR QUE OS MINISTROS DO STF NÃO TRATAM DA DIMENSÃO GEOPOLÍTICA DAS CONDENAÇÕES DE LULA NO ÂMBITO DA LAVA JATO?

Embora tenham atentado  para as gravíssimas  mensagens  decorrentes da Operação  Spoofing,trocadad entre juiz e procuradores ,e para o que foi considerado  como "cooperação espúria" os ministros  não  avançaram  para a cooperação  com agentes estrangeiros  e para o ponto que nos parece fundamental. 

POR LARISSA RAMINA
Professora de Direito  Internacional da UFPR
Membro  DA ABND- Associação Brasileira de Juristas pela Democracia 
10/03/2021

Nos últimos dias os holofotes se voltaram ao STF,quando o ministro Edson Fachin,  em decisão  monocrática declarou a incompetência da décima terceira Vara da Justiça  Federal de Curitiba para jugar as ações penais contra Lula. O fundamento,a avançado  há  muito pela defesa do ex-presidente , foi a falta de relação direta com os desvios da Petrobrás. 
Como consequência  foram anuladas todas as decisões, quais sejam,  o recebimento de denúncia, a condenação e confirmação das mesmas por órgãos superiores,  nas ações relativas ao triplex do Guarujá, ao sítio de Atibaia e ao Instituto Lula, bem como seu envio ao juízo  competente : a Justiça Federal do DF.O impacto direto  nos direitos políticos de Lula foi torná-lo elegível, muito embora a decisão venha tardiamente  e os danos sejam de impossível reparação.  Entretanto,a decisão do ministro Edson Fachin, que parece  ter surpreendido os membros da Corte,  não apenas anulou as condenações de Lula, mas determinou que a ação sobre a suposta parcialidade do ex-juiz Sérgio  Moro, iniciada em 2018 e suspensa após  dois votos contrários à  suspeição,não fosse  mais julgada. O ministro Gilmar Mendes  ter considerado  o relator da Lava  Jato, ao tentar evitar o julgamento sobre a suspeição de Miro e salvar a Operação,passou por cima da Segunda Turma decidindo sozinho  questão que deveria ser colegiada. 
Retomou então  o julgamento sobre a suspeição,  que por sua vez impôs derrota às tentativas do ministro Fachin de adiar ou deslocar o caso ao plenário. Afinal, a suspeição  pode afetar atos não  atingidos pela incompetência, como aqueles que envolveram a produção  de provas.  Tal oportunidade possibilitou que a Segunda Turma do STF desse início  a uma espécie se análise,autocrítica e revisão da tumultuada história judicial  recente do país.  Os argumentos favoráveis  à  suspeição baseiam-se  em diversos atos processuais  e condutas do então  juiz, matizados com motivação pessoal e viés político -partidário,  como os que determinaram a condução  coercitiva de Lula para depoimento;a interceptação telefônica  do ex-Presidente,familiares, e até  de advogados;a atuação impeditiva  ao cumprimento de decisão  restabelecendo sua liberdade; o levantamento do sigilo da colaboração de Antonio Palocci às  vésperas  das eleições;  ou o aceite para integrar  um governo eleito em razão  de suas decisões judiciais. Não  há  dúvidas  de que  esses argumentos  confirmam  que a persecução  criminal  de Lula foi usada para fins políticos -eleitorais de Moro e seus aliados.  Não obstante, é  preciso olhar  para o que está  mais além : por que od ministros  do STF não tratam da dimensão  geopolítica  dessas  condenações  no âmbito da Lava Jato?  Nessa dimensão  está  uma nova estratégia de guerra não  convencional,alternativa à  guerra militar,conduzida a partir da utilização  perversa do sistema de justiça para fins militares, políticos, econômicos ou geopolíticos.  Trata-se da guerra jurídica,  conhecida também  pela expressão  "lawfare". Embora tenham atentado   para as gravíssimas  mensagens decorrentes da Operação  Sporting,trocadas  entre juiz e procuradores, e para o  que foi considerado  como "cooperação espúria ",os ministros não  avançaram  para a cooperação  com agentes estrangeiros  e para o ponto que nos parece  fundamental : há  fatos geopolíticos internacionais  determinantes  gravíssimos por trás das condenações de Lula e da própria  Lava Jato, que embora  não tenham sido tratados nos votos conhecidos conhecidos - e constrangidos pelos erros cometidos, certamente  não  passaram despercebidos. 
Muitos são os que entendem que hoje no Brasil  está  vigente um estado de exceção  consequência de um complexo processo global  de redefinição da soberania popular  em prol de outro soberano,  que no contexto neoliberal  é  o chamado  " mercado " e que age  em nome de interesses ocultos  invisíveis, subordinado  a política  à  economia. Nesse cenário ,operadores  jurídicos são cooptados  por tais interesses  e passam operar  como seus verdadeiros  advogados, proferindo decisões  judiciais  de natureza excepcional  a pretexto do combate à  corrupção, ao que se tem denominado " estado de exceção  judicial ". O próprio STF parece ter criado  uma jurisprudência  de exceção  em apoio a Lava Jato, segundo comprova a decisão de 2016 que admitiu  o início da execução penal condenatória  após  sua  confirmação em segundo grau, em flagrante violação  constitucional. 
Por isso,  não  é  exagero afirmar que o Poder Judiciário hoje, incluindo todas as instâncias, pode ser considerado o principal  agente de exceção no Brasil. 
Lembre-se que em 2013 Moro teve sua parcialidade  debatida pelo STF no  âmbito do caso Banestado. À  época, o ministro Celso  de Melo,único  a votar pela anulação  da sentença, chegou a indagar : " não  estaríamos validando  um comportamento transgressor  de prerrogativas básicas? ". Na ocasião,  o decano  listou tratados  internacionais que consagram o princípio  do devido processo legal e seus  correlatos. A tese vendedora,  do ministro Gilmar Mendes, todavia considerou  que " não  possível confundir excessos com parcialidade ". Foi necessário  esperar  até  2020 para que o STO anulasse pela primeira vez uma sentença do ex-juiz,  também no caso Banestado. No julgamento de terça -feira, o ministro Gilmar Mendes relembrou o caso e admitiu : "os órgãos  de controle da magistratura  nacional falharam  em conter os primeiros arroubos de abusos do magistrado ". Faltou dizer  que falharam em conter o estado de exceção  judicial  consequente da guerra jurídica contra o Brasil.
A partir de 2014,a Lava  Jato chefiada por Moro  protagonizou uma série  de prisões cautelares  de empresários  e de agentes  públicos,  somadas a vazamentos  seletivos de informações  e orquestradas com  grandes veículos de comunicação  social, que criaram as condições  sociais e políticas   para a instauração  de um processo de impeachment  e a posterior destituição  da Presidenta  Dilma Rousseff. Esse golpe de Estado  parlamentar  viabilizou  a retomada de  um projeto ultraliberal derrotado nas urnas,  efetivado com retrocessos  sociais, destruição de parte essencial da indústria nacional  e a nefasta interferência no processo eleitoral brasileiro,  tudo sob a condução da Lava Jato,  mediante a colaboração criminosa  com agências estrangeiras,  entre as quais  o Departamento  de Justiça  dos EUA,o FBI e a CIA.Está claro que a eleição  da extrema -direita  resultou do regime change perseguido há  muito tempo  pelos  interesses hegemônicos. Tamanha  foi a articulação para impedir a candidatura de Lula às  eleições  de 2018, que Moro recebeu do presidente eleito o troféu de Ministro da Justiça, com a missão de implementar reformas legislativas  consoantes  com o sistema de exceção  inaugurado pela Lava Jato. Esses fatos evidenciam que faltou  aos ministros do STF,portanto, reconhecer que BA origem  da condenação  de Lula  por juiz parcial  e do estado  de exceção judicial, está  uma guerra jurídica  em curso no Brasil, com objetivos geopolíticos  e justificada na luta anticorrupção,  por meio da utilização  de mecanismos transnacionais de persecução, da aplicação extraterritorial de legislação dos EUA sem elementos  de conexão suficientes, e com a cooperação criminosa de operadores do sistema de justiça nacional apoiados por uma mídia comprometida. Por trás  dessa complexa  trama de colaboração /intervenção internacional  está  a ação do imperium econômico  estadunidense para frear projetos políticos alternativos  ao modelo neoliberal e,assim,destruir o potencial soberano do país alvo. 
Disso decorre uma consequência importsnte: a parcialidade  em discussão  no Supremo não deveria solopar  apenas  o então  juiz, mas também todos os agentes do MPF e da PF envolvidos na Operação  Lava Jato. A reação  e a blindagem contra essa nova e letal estratégia de guerra jurídica exige a compreensão de suas engrenagens, a atenção para programas internacionais de formação  jurídica  destinados a agentes brasileiros  e para S relações destes com organismos estrangeiros; a discussão da regulamentação e democratização  da mídia;  e sobretudo,é  fundamental  distinguir  o lawfare da verdadeira luta anticorrupção,aquela que deve ocorrer dentro dos parâmetros  da legalidade  e em respeito ao Estado Democrático de Direito.Daí  a importância  de o STF reconhecer a dimensão  geopolítica  dos julgamentos envolvendo  o ex-Presidente Lula,conduzidos  no âmbito do que foi  considerado o maior escândalo judicial da história brasileira. 

Pensem nisso enquanto eu  vos digo até  amanhã. 

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